terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Mundo virtual é mais do que real.




Vale a pena conferir e refletir sobre o texto abaixo, escrito pela psicóloga e consultora em educação, Rosely Sayão, para a Folha de São Paulo


A cultura do mundo virtual



DE SÃO PAULO
18/02/2014 03h00


O chamado mundo virtual -esse no qual entramos e passamos um tempo quando acessamos a internet- é demasiadamente real.

Eu tenho considerado a possibilidade de que o fato de o termos nomeado virtual possa ser uma das razões que colaboram para nos deixar confusos quando estamos nele. É que essa nomeação nos leva a crer que esse é um mundo à parte de nossas vidas. Não é.

De modo geral, nós adultos, independentemente da classe social, cultural e do nível de escolaridade e/ou de conhecimento, não aprendemos ainda a entender a complexidade desse espaço na prática, ou seja, quando fazemos uso dele.

Isso significa que os mais novos não estão aprendendo muita coisa em relação a como se comportar quando estão na internet, ou melhor, estão até aprendendo, mas muita coisa errada.

Já temos diversos e bons protocolos de segurança que ajudam bastante os pais que têm a missão de proteger os filhos quando eles acessam a rede; temos também programas especializados que os pais podem instalar nos computadores que os filhos usam e que impedem que as crianças tenham contato com material inadequado à idade deles ou aos valores familiares.

Finalmente, temos inúmeras e boas cartilhas de orientação a pais sobre como proceder quando os filhos usam a internet. Não basta. Precisamos avançar.

Primeiramente, é urgente que aceitemos o fato de que, na internet, não há privacidade. Basta lermos as notícias que as mídias nos apresentam para constatar que nem mesmo dados sigilosos de Estado estão a salvo atualmente. Ora, e por que nossas bobas conversas e/ou comentários virtuais estariam?

Sim, há quem só se interesse por informações confidenciais que podem ser publicadas por diferentes interesses. Mas há também quem tenha como único motivo expor nossas falhas, nossos preconceitos, nossas fragilidades. E há também quem goste de atacar tudo o que é diferente do que pensa, é bom lembrar.

Há quem acredite que os comentários grosseiros, agressivos, violentos e pessoais contra autores que têm a coragem de publicar suas opiniões a respeito de variados assuntos só surgiram com o advento da internet. Não, isso é coisa antiga.

O filme "Hannah Arendt" nos dá uma boa mostra desse fato. A diferença é que, antes da internet, apenas quem trabalhava na imprensa e o próprio autor do artigo sabiam dos comentários grosseiros ou violentos que seu texto suscitava. Hoje, com a internet, eles estão abertos todos.

Precisamos também considerar o fato de que os mais novos são impulsivos: eles primeiro agem, depois é que pensam. Na internet, isso é um grande problema porque, depois de algo publicado, é difícil, muito difícil, apagar. Até é possível deletar alguma bobagem que falamos ou fizemos, mas se alguém já registrou, já pode estar eternizado. O arrependimento, nesses casos, pode ajudar a não cometer o mesmo erro, mas não absolve o já cometido.

Não considero que nosso comportamento determine os comportamentos de nossos filhos, netos, alunos etc. Mas, no caso da internet, estamos criando uma cultura para os mais novos. E, atualmente, essa cultura afirma que na internet vale quase tudo e que só quem eu quero tem acesso ao que eu publico; temos construído a ideia de que ela é um parêntesis de nossas vidas.

Não podemos permitir que as crianças e os jovens acreditem nisso, por isso é importante que sejamos mais críticos, controlados e comedidos em nossas ações na internet, não é verdade?




Fonte: Folha de São Paulo.

Endereço da página:

http://www1.folha.uol.com.br/colunas/roselysayao/2014/02/1413754-a-cultura-do-mundo-virtual.shtml

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Associacão de Defesa e Desenvolvimento Ambiental de Ferros está preocupada com os impactos da mineração e propôe projeto de lei para preservar o Rio Santo Antônio.




Não é preciso que o ferrense viaje para longe para ver o que é a devastação provocada por uma obra de mineroduto.

Desenvolvimento é algo que não se vê em Conceição do Mato Dentro, cidade vizinha que sofre com os impactos sociais provocados pelo Projeto Minas-Rio, da Anglo American.

De 2008 para cá, 8 mil funcionários de cerca de 70 empresas terceirizadas da mineradora lotam a cidade.

De acordo com matéria publicada pelo Jornal Hoje em Dia em novembro de 2013, os 18 mil moradores enumeram os problemas enfrentados por conta da presença das empreiteiras: ruas esburacadas e sem pavimentação, violência (aumento de estupros, sequestros e assaltos), áreas invadidas, trânsito sem sinalização, aterro controlado transformado em lixão  a céu aberto, entre outros.

A consequência mais visível – e sem previsão de solução – foi a invasão de terrenos públicos por moradores que não conseguiram mais pagar aluguel. Uma locação por 300 reais mensais subiu para até 3 mil reais.

Ponto turístico da cidade, o Parque Salão de Pedras teve 600 ocupações irregulares em três meses.

O aumento do aluguel também fez com que o número de policiais militares caísse de 27 para 12 na cidade (em uma cidade que recebeu 8 mil novos moradores), já que a maioria não conseguiu mais arcar com
a despesa e nenhum militar quer ser transferido para lá. O aumento da criminalidade foi a consequência.

Além de policiais, falta também agentes da Copasa, pelo mesmo motivo: aluguel alto. A empresa opera com 1/3 dos funcionários que precisaria. A cidade já se preocupa com a falta de água, pois não foi projetada para tanta gente. Seis novos loteamentos abrigam mais de 500 pessoas cada um, em condições semelhantes a favelas.

O Ministério Público Estadual (MPE) estima que 200 casas e pequenos prédios na área urbana viraram repúblicas para trabalhadores diretos e indiretos da Anglo American. Uma equipe do Ministério Público do
Trabalho flagrou 172 operários abrigados em “condições análogas ao trabalho escravo” em um imóvel na área urbana.


Lixo e superlotação

Desde a chegada dos trabalhadores na região, o volume de resíduos produzidos e levados para o aterro controlado, às margens da MG-010, aumentou em proporções absurdas. Há indícios de contaminação
do lençol freático. O lixão fica em um terreno com uma guarita sem vigia ou controle de entrada e saída de veículos. Em novembro, o Jornal Hoje em Dia flagrou o depósito irregular de materiais hospitalares
na área, sem aterramento.

A chegada dos trabalhadores terceirizados trouxe outros problemas estruturais, como em hospitais, em postos de saúde, nos Correios e em bancos lotados todos os dias da semana. Para se ter uma ideia, as
duas creches públicas de Conceição do Mato Dentro têm capacidade para abrigar 90 crianças.

O Conselho Tutelar afirma que atualmente faltam 200 vagas com a chegada de novas famílias à cidade.

Já para a região de Ferros, a Manabi prevê a chegada de cerca de 3 mil trabalhadores de empresas terceirizadas, o que representa mais de 1/4 do total da população atual do município.

A presidente da Associacão de Defesa e Desenvolvimento Ambiental de Ferros - Addaf, Tereza Cristina Silveira, a Tininha, cobra uma posição mais firme do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Santo Antônio quanto à questão: “O comitê precisa passar a cumprir seu papel de representante dos interesses da bacia e da sociedade, se posicionando de forma contundente contra esse empreendimento. O Ministério Público tem que agir rápido, pois denúncias gravíssimas foram feitas em Comissões da Assembleia de Minas. "Até agora nada foi feito para impedir essa devastação”, diz Tininha.. Só um projeto de lei pode salvar o rio Santo Antônio


A Addaf propõe um Projeto de Lei de Iniciativa Popular para tornar os trechos ainda íntegros da Bacia do Rio Santo Antônio em área de proteção ambiental permanente, a exemplo do que ocorre com a Bacia do Rio Cipó, na Serra do Cipó.


Com base na riqueza da biodiversidade da bacia, localizada em um importante remanescente de Mata Atlântica, e do valor da ictiofauna, que tem vários peixes endêmicos em extinção, a entidade espera impedir que ela seja ainda mais devastada.

Representantes de vários movimentos sociais da região estão recolhendo assinaturas para tornar o Projeto de Lei apto a ser votado no Congresso Nacional. São necessárias, no mínimo, 10 mil assinaturas
para que isso ocorra.

Depois da devastação promovida pela Anglo American com o Projeto Minas-Rio na região da Bacia do Rio Santo Antônio, autorizada pelos Governos Federal e Estadual, agora é a vez da Manabi tentar impor a 23 municípios o seu mineroduto.

A presidente da Associação de Defesa e Desenvolvimento Ambiental de Ferros (Addaf) se diz perplexa com a postura do Ibama, que acelerou a realização da audiência pública sobre o mineroduto da Manabi em
Ferros para que fosse feita durante o recesso parlamentar: “Diante doerro que foi conceder licenças aos projetos da Anglo American e da Ferrous, o Ibama não deveria cogitar conceder qualquer licença para
novos minerodutos. Fazer isso enquanto nossos representantes estão de férias é no mínimo desleal, um desrespeito a toda sociedade”, avalia Tereza Cristina Silveira.

Tininha cobra firmeza dos prefeitos para que não concedam declarações ou autorizações ao projeto: “Muitos prefeitos ainda não concederam anuência para que esse projeto absurdo seja executado. No entanto, o bem-estar e a vontade do povo não interessa mais para os órgãos licenciadores. Os prefeitos precisam ser firmes contra esse extermínio dos nossos recursos. Sem anuência dos municípios, essa empresa
predadora não conseguirá a licença prévia para acabar com o nosso rio e com a nossa cidade”, complementa.

Com mais de 500 km de extensão, o mineroduto da Manabi prevê o transporte de minério de Morro do Pilar a Linhares, no Espírito Santo, usando água da bacia do Rio Santo Antônio. Este é o segundo empreendimento previsto para a região. Ferros é o município mais afetado pelo mineroduto da Manabi, com 54 km previstos na faixa de servidão.


O próprio Governo de Minas é acusado de promover a devastação do território do estado, facilitando licenciamentos. “Minas Gerais virou uma Casa da Mãe Joana quando o assunto é disciplinar a ação das
mineradoras. O Estado faz vista grossa, o Ministério Público vem perdendo as ações que propõe, pois falta uma reação mais coesa e enérgica da sociedade”, afirma o deputado Rogério Correia (PT).


De acordo com o deputado, os órgãos ambientais precisam ser investigados, pois reconheceram, em audiência pública realizada na Comissão Extraordinária das Águas da Assembleia de Minas, em 26 de
agosto, que não têm condições de fiscalizar de forma adequada aos empreendimentos da região. “No entanto, toda vez em que foi proposta uma CPI da Mineração, não conseguimos recolher o número mínimo de assinaturas aqui na Casa”, lamenta Correia.


Como resultado da mesma audiência, depois de várias denúncias de irregularidades nos licenciamentos e abusos das mineradoras, a Comissão Extraordinária das Águas enviou vários requerimentos pedindo
a paralisação do Projeto Minas Rio aos órgãos ambientais estaduais e federais responsáveis. Os documentos foram prontamente ignorados.

Em Conceição do Mato Dentro, sede do Projeto Minas-Rio, da Anglo American, o Ministério Público questiona a falta de fiscalização. “Já está na hora de nos perguntarmos a quem interessa o sucateamento
das estruturas fiscalizadoras do Estado. Quem paga o preço disso são os cidadãos. Nosso Estado precisa repensar o seu modelo de desenvolvimento”, diz o promotor Marcelo Machado.

Fonte: A matéria acima foi escrita e publicada pelo informativo O Andirá., de 03/01/2014