Nesta sexta-feira, ao chegar à Rádio Inconfidência para trabalhar, encontrei uma colega jornalista que me fez a seguinte pergunta: - E aí, como foi o carnaval em Conceição do Mato Dentro?
Confesso que titubiei ao responder: - Em Conceição? O carnaval?... Bem ...Foi axé! Curti mais as cachoeiras... Ela então falou: - Que pena! Carnaval no interior, geralmente, é tão gostoso, não é? E completou: - Axé é na Bahia, não tem nada a ver com nosso carnaval mineiro! Com um certo pesar, apenas falei:- exatamente! Em seguida, ela subiu no elevador e o assunto foi encerrado.
Havia prometido a mim mesma que não voltaria a escrever, por agora, sobre o carnaval em CMD, por achar que já teria dito quase tudo que tinha para dizer e que não gostaria de ser repetitiva. Mas, percebi que ainda tenho alguma coisa para falar e a vontade de me expressar continua. Sinto que, ao falar, falo não só por mim, mas por pessoas que também gostariam de ter espaço e a oportunidade de dizer o que pensam, querem, sonham...
Para vocês terem uma idéia de como às vezes é difícil não falar do assunto, nessa quinta-feira, liguei para meu pai, em Conceição e ele me perguntou: - E aí, Déborah? Não vai escrever no seu blog sobre o sucesso que foi o carnaval em Conceição? Que foi o melhor carnaval da região? Na mesma hora eu respondi: - Carnaval? Que carnaval? Melhor da região para quem? Para o senhor? Para a população? Para a Prefeitura? Para quem gosta de axé? Para quem curtiu a megaboate? Para quem produziu a festa ou ganhou dinheiro com ela?
Para mim e várias outras pessoas, o carnaval em Conceição do Mato Dentro não existiu. O que houve foi uma grande festa axé, com milhares de pessoas, principalmente jovens, dançando. Eu até que tentei, como vários outros conterrâneos, curtir a festa também, mas não consegui permanecer por mais de 5 minutos na praça onde aconteceu o carnaval. Não me identifiquei com a festa e preferi ir para casa dormir e descansar.
Reconheço que o axé deste ano atraiu muitas pessoas, gerou emprego e renda, movimentou a economia da cidade...Mas ...E se fosse um carnaval tradicionalmente mineiro, bem produzido, será que não geraria também os mesmos benefícios ou até muitos outros mais?
Já disse e repito, temos que definir um plano de turismo sustentável para Conceição do Mato Dentro e definir que tipo de turista queremos. E também preparar a cidade para receber e ensinar o visitante a respeitar nossas áreas de lazer, nossas cachoeiras, nossas ruas...
A última edição do jornal publicado pela jornalista Roberta Zampetti em Conceição do Mato Dentro mostrou a falta de respeito com que as pessoas tratam nossas cachoeiras. Jogam lixo, poluem e depois vão embora na maior cara-de- pau, como se o problema não fosse delas. É isso que queremos para Conceição? Vamos deixar que isso aconteça sem colocar a boca no trombone?
Sou alguém que acredita na consciência e justiça sociais, que acredita que todos deveríam ter direitos e deveres iguais, que valemos pelo que somos não pelo que temos, que procura respeitar as pessoas e suas idéias e defende muita responsabilidade quando o assunto é cuidar do que é de todos. E por acreditar que a democracia é possível, sinto-me no direito de questionar, sugerir, propor e cobrar. E hoje recebi um comentário do Geraldo Márcio, conceicionense sempre presente em Conceição, conhecido como Marcinho do Gigi, que me fez ver que estamos no caminho certo quando debatemos assuntos que dizem respeito à preservação de nossa cidade. Acho que vale a pena ler o comentário e refletir sobre o que ele escreveu:
"Déborah , este é o momento! O que se fizer nestes próximos 10 anos em Conceição, com certeza, irá definir o próximo século de nossa cidade. Acho importante ressaltar, que a responsabilidade não é só política, mais sim de todos nós, que na prática, muito pouco fizemos por Conceição.
Acredito, que só com uma união forte entre os mato dentro e os mato fora, poderá ser criada realmente uma força pensante e de mudança, independente da situação política. Fico impressionado de ver o grande número de conceicionenses, que se recolhem de uma participação mais ativa, sempre falando: a política lá é difícil... e todos nós sempre paramos nesse chavão...
Se a política atrapalha, vamos criar algo mais forte do que ela. Afinal, um dia todos nós vamos passar e esperamos que Conceição continue com suas belezas naturais e culturais.
O que se questiona não é a necessidade de se desenvolver, mas sim, se somos capazes de transformar esse crescimento em algo harmonioso. Uma associação, uma Ong, algo que esteja distante e acima dos efêmeros 4 anos de poder, afinal somos muito maiores que isso.
Marcinho do Gigi,
27 de Fevereiro de 2009 21:03"
Obrigada, Marcinho, pelas suas palavras! Temos mesmo que nos unir e debater caminhos alternativos para Conceição, caminhos que sobreponham as desavenças e os ranços políticos.
Como já disse nos textos anteriores, o Carnaval é uma das formas de expressão cultural e popular que reúne crianças, jovens, adultos e idosos e onde as pessoas se fantasiam, liberam a criatividade, participam de blocos caricatos, assistem e participam de desfiles de escolas de samba, encontram os amigos a até se vestem de mascarado, como fazíamos antigamente e bem lembrou o conterrâneo Delmiro Portilho, que, quando adolescente, confeccionava, com muita habilidade, máscaras feitas de papel maché e que comprávamos na mão dele para vestir de mascarado e sair assustando as pessoas pelas ruas da cidade! Era gostoso demais essa brincadeira! Delmiro, inclusive, disse que quer voltar a fazer essas máscaras para o carnaval do próximo ano. E eu torço para que tenhamos espaço e clima para usá-las, Delmiro. Você sabia que consigo sentir ainda o cheiro que tinham essas máscaras?
Carnaval, na minha opinião, não é essa massificação cultural que cada vez mais vem sendo imposta como uma praga que se alastra por todos os lados. O axé saiu da Bahia, penetrou em vários lugares e comprometeu a diversidade cultural. Respeito as pessoas que curtem o axé. Tem algumas músicas que eu gosto também. Mas acho que o axé tem mais a ver com a Bahia, pois faz parte da cultura deles. Acho ainda super válido que se faça uma troca de culturas, mas que o nosso carnaval mineiro seja priorizado. Realmente, fico triste quando vejo nossa Conceição indo na contramão da tradição. A Prefeitura deveria ser a primeira a cultivar, defender, valorizar e preservar a história e os costumes da cidade. Pode sim, trazer o novo, mas sempre com respeito à verdadeira identidade da população.
Outra coisa que ouvi muito nos últimos dias é que carnaval é isso mesmo, que é coisa para jovem... Fiquei indignada quando me falaram isso! Quer dizer que apenas os jovens têm o direito de dançar e aproveitar o carnaval? Quem não é jovem não tem o direito de viver a vida e por isso deve morrer? Quem não é jovem tem que ficar em casa vendo televisão ou dormindo? E afinal, o que é ser jovem?
E dormir foi exatamente o que fizeram várias pessoas que moram ou possuem casa na cidade, que estão acostumadas a participar e prestigiar todos os eventos que acontecem em Conceição e que também tentaram curtir o carnaval e quando chegaram à praça Ubaldina, voltaram para trás, pois não encontraram espaço e nenhuma manifestação com a qual elas se identificassem. Conclusão: moradores de diversos bairros, pessoas que fazem parte da história de nossa cidade, que pagam impostos, que também geram emprego e renda, que trabalham pelo desenvolvimento da cidade ficaram totalmente deslocados em sua própria terra e completamente excluídos desse carnaval .
Eu não falo isso só por mim não. Eu moro em BH, tenho várias opções de lazer e posso escolher os lugares aonde quero ir, se quiser dançar, me divertir. Falo isso, principalmente, pelas pessoas que moram em Conceição e que não podem ou não têm a opção de viajar e sair da cidade e que ficaram totalmente de fora do carnaval deste ano por que não se identificaram com o axé. Pessoas que em anos anteriores saíam de casa para assistir ao desfile da Escola de samba da Band, para ver os blocos caricatos e o movimento na Avenida e que este ano ficaram a ver navios. Não que os outros carnavais fossem perfeitos, mas pelo menos eles possibilitavam uma maior participação de pessoas de todas as idades e classes sociais.
Espero e torço para que no próximo ano Conceição se una a Ouro Preto, São João Del Rei e Mariana e promova o carnaval das cidades históricas e realize um carnaval que tenha a nossa cara, um carnaval para todos.
Por falar em preservar a história e em participação popular, a cidade de Pedro Leopoldo, localizada na Região Metropolitana de Belo Horizonte dá um show no quesito respeito às tradições e manifestações populares. Todos os anos é realizada na cidade, a festa Boi da Manta, onde o boi é figura de destaque. Nesse evento, que é realizado todas as quartas e sábados antes do carnaval, adultos e crianças se fantasiam com muita criatividade e se tornam "mascarados".
Na última sexta-feira, antes do carnaval, o povo se despede da brincadeira do boi. Essa despedida é chamada de "enterro do boi" e tem como ponto máximo o momento em que o "boi" é jogado no Ribeirão. Como ele é feito de taquara, ele fica flutuando. E quando ele é jogado no rio, todos os foliões que acompanham o cortejo choram a morte do boi que, entretanto, renasce a cada carnaval.
A festa atrai milhares de turistas que também são convidados a participar da folia.
Este ano fui conhecer o Boi da Manta e adorei. O que mais me encantou, entretanto, foi ver a animação e envolvimento dos moradores da cidade no evento.
Foi realmente emocionante ver crianças, jovens e adultos com fantasias variadas e criativas, todos unidos e animados, participando dessa festa que é uma verdadeira e rica expressão da genuína cultura popular e que por isso merece ser preservada..
Parabéns a Pedro Leopoldo por manter e respeitar a história e as tradições que são a maior riqueza de um povo.
Vejam as fotos do Boi da Manta em Pedro Leopoldo.